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4° dia: Salta - Susques

Antes de começar o quarto dia gostaria de contar uma coisa engrassadíssima que aconteceu ontem e esquecemos.

A região do Chaco Argentino tem uma ruta que se estende por mais de 800 km onde uns 700 km é uma reta só. Depois de umas quatro horas pilotando a moto, a Lilian pergunta “quer que eu pilote um pouco pra você descansar?”, achei isso legal e lá foi ela montando na moto e eu servindo de cavalete central na garupa. Ela arrancou com a moto super bem, foi evoluindo as marchas perfeitamente. Andou uns 5 km apenas e aparece um guarda do nada... Pediu pra ela parar, mas como ainda não é acostumada com a moto, freou meio que em cima do guarda. Ele perguntou por que ela estava correndo tanto e pediu uma contribuição pra pintar a delegacia.  Achamos melhor contribuir e fomos embora. Deu uma dó... Eu ando mais de 700 km sem nenhum problema e na hora que a bichinha toda contente vai dirigir, acontece isso.

Bom, voltando ao 4º dia: saímos de Salta cedo e não queríamos ir direto para San Pedro de Atacama. Já ouvi relatos que é muito ruim e perigoso atravessar as cordilheiras à tarde. Então resolvemos dormir em Susques, uma cidade a 110 km da fronteira da Argentina com o Chile. Aí começaram as lindas paisagens!

Passamos pela cidade de Pumamarca, um vilarejo incrustado numa região de montanhas de várias cores.

Uma cidadezinha linda, com pessoas do mundo inteiro. Ficamos um pouco, batemos um papo, comemos alguma coisa enquanto olhávamos as pessoas irem e virem.

Subimos na moto e fomos para Susques. Subimos uma serra com muitas curvas (muitas mesmo!), uma região linda demais. Foi aí que começou a doer a minha cabeça. Subimos até uma altura de 3800 metros acima do nível do mar e o oxigênio mais escasso começou a me deixar ruim, minha cabeça parecia que ia explodir, mas mesmo assim consegui ver cada detalhe da paisagem, cada curva, as montanhas de diversas formas e tamanhos, enfim, tudo muito lindo. E frio! Muito frio...

Foi nessa região que avistamos o primeiro salar da viagem. Um mar branco, uma coisa fantástica que só tínhamos visto por fotos. Confesso que me emocionei com esse presente do papai do céu! Colocamos a moto dentro do salar, tiramos algumas fotos e fomos pra estrada novamente.

Passamos um povoado e comecei a ficar preocupado com a gasolina, liguei o GPS e vi que havia um posto muito perto e resolvi seguir o GPS. Chegamos numa casa que tinha duas bombas, mas tudo muito quieto e esquisito. Chamei e apareceu uma senhora banguela, perguntei se tinha “nafta” e ela disse que sim. Pois ela mesma abasteceu a moto, recebeu o dinheiro, me deu o troco, enfim, devia ser a dona do posto de gasolina que ficava no quintal da casa dela.

Começamos a correr atrás de hotel naquele fim de mundo. Nos dois únicos bons hotéis não havia vagas. Fomos ao “pueblo” atrás de alguma hostal, hotel ou qualquer lugar pra dormir, mas só tinha índios que mal falavam o espanhol e pareciam ter vergonha da gente.

Voltamos para o primeiro dos dois hotéis que gostamos para implorar por una habitación e a moça (acho que estava com dó da gente) conversou com alguém e voltou meio que rindo (ela também era banguela) dizendo que havia duas camas separadas “lá em cima” e se quiséssemos poderíamos ficar. Eu disse que queríamos ver. Ela nos levou a um sótão de uma dispensa, numa espécie de masmorra separada do hotel.

Tínhamos que subir por uma escada feita de madeira com arames, o piso era feito de madeira enrolada com arame também com uma camada de cimento e, conforme pisávamos, caíam algumas pedras soltas do cimento.

Quando eu com meu peso pesado subi, senti tudo oco. Falei pra Lilian que não ficaria ali nem a pau e falamos pra moça do hotel que iríamos dar mais uma volta. Tempo perdido pra falar a verdade, porque sabíamos que não encontraríamos nada. Bati o pé querendo voltar pelo menos pra Pumamarca e a Lilian disse que não, que então era melhor seguirmos pra frente e não pra trás. Ficamos naquela indecisão, o sol começou aos poucos a desaparecer no céu e fui convencido a dormir ali mesmo, mesmo com o piso caindo.

A Lilian com muita paciência me mostrou toda a estrutura do piso e tive a certeza que não cairia mesmo. Ela me mostrou como seria bom dormir ali do que qualquer outra opção que tínhamos. Tínhamos um abrigo, um lugar pra descansar, um lugar pra comer – e era só o que importava naquele momento. Acertamos o preço, arrumaram as camas pra gente, vimos o pôr do sol na varanda do hotel, usamos a internet, tomamos café, sopa, jantamos e ficou tudo bem.

Mesmo sem tomar banho, fomos nós pra nossa masmorra. Dormi mal demais, não conseguia respirar direito, foi uma noite péssima pra mim, mas eu precisava estar bem porque no dia seguinte atravessaríamos o Passo de Jama e a Cordilheira dos Andes com seus mais de 4000 mil metros de altitude...

A Lilian, por sua vez, não parava de dar risada antes de dormir (de toda aquela situação e das minhas reclamações) e quando pegou no sono, capotou. Pelo menos ela estava verdadeiramente bem. E isso era mais do que importante pra mim.























Se quiser ver todas as fotos clique aqui




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